Primeiro dia da Martha na repartição. Limpando a escrivaninha ela derrubou um pacote empoeirado da última gaveta. Assoprou a poeira e retirou de dentro um maço de cigarros Minister. Esfregou um pouco o plástico embaçado de bolor e um fumacê com cheiro de detefon invadiu o cubículo.
Perante a pequena funcionária surgiu um sujeito muito forte, envolto por uma bruma amarela e pálida; de bermuda cargo caqui, sandálias Jesus Cristo e gola V básica marrom da Hering. Martha assustou-se assim que a flutuante aparição pareceu pousar delicadamente no carpete grudento. Ela apanhou com dificuldade o óculos que voara atrás do monitor e assim que se posicionou de volta, o sujeito colou o cavanhaque em sua bochecha esquerda: - Preciso de um elástico.
Martha estremeceu os joelhos e pinçou ligeira uma meia dúzia de elásticos que dispunha na mesa. Soltou-os na palma dele.
—Tem direito a três desejos, Martha.
—Paz Mundial! - Quase se engasgou, pra em seguida rir ardida com um meio sorriso cor de palha seca. — Desculpa, piada ruim...
— Não, nunca um mestre pedira algo do tipo. Eis... Está feito, querida.
Ela já dava totó com o bico do salto na divisória de compensado, quando um pio de filhote de passarinho irrompeu sabe-se lá aonde e um improvável raio de sol fez brilhar um copo de água morna que estava perigosamente equilibrado num bloco de notas.
—Quero ser trilhardária, então. Já que é assim.
O gênio suspirou enquanto acertava o coque castanho com um dos elásticos. —Pode crer que já é, querida. E o último desejo?
Martha pensou com clareza nas suas possibilidades, descartando pedidos estéticos, principalmente por julgar serem desnecessários. Sendo assim, pediu aquilo que almejara apenas em um sonho longínquo. — Quero ser uma estrela de Hollywood!
O coque imediatamente lhe entregou um papel com numero de telefone. — Me add no zap, querida e vamos marcar uma sessão de fotos no meu estúdio. Vai ter vinho, Netflix, vemos então o que posso fazer. — Piscou e coçou o joelho, o que foi tão estranho (coçar o joelho) que quebrou um manto místico que pairava até então. Novamente uma bruma pálida amarela derramou-se no chão e o gênio saiu manso num moonwalk enquanto borrifava manualmente uma lata velha do próprio detefon.
— Amiga...? Oi, amada...? Aqui no alto.
Martha atônita olhou para os olhos inchados que a observavam no topo da divisória do cubículo.
— Me chamo Geise, sou a vizinha de trampo. Olha só, não liga pro Jeferson, ele manda essa história de gênio pra todo mundo. Não teve paz mundial, continuamos pobres e ele definitivamente só quer te vencer no mario kart lá na casa da mãe dele. Ainda achou essa porra de veneno dos anos 80 na gaveta nojenta desse muquifo. Ah, e vamos fumar esse minister no intervalo. cof, cof
— Cof, cof, cof.
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