Meio dia. Sentado em um rochedo. A armadura de ferro brilhava ao sol
com centenas de borboletas brancas pousadas em sua estrutura. O
cavaleiro observava fixamente sua espada cravada na terra.
— As
borboletas procuram as flores dos candelabros de ouro no final da
descida. O sereno seca no gramado. É alto o dia e seu corpo ferve um
perfume doce.
O cavaleiro virou levemente o pescoço e o rosto encharcado ficou de frente para o recém chegado.
— E você é o mago?
Ao mesmo tempo, no mesmo local, mas em uma outra época:
— 357. — Identificou a própria arma de forma cuspida para uma garotinha.
A garotinha juntou as mãos em frente a boca e soltou um riso abafado. O
rosto encardido fez-se corado e o velho pistoleiro ergueu a mão
esquerda em sua direção. Antes de conseguir passar a mão no topo da
cabeça da criança, ela saiu correndo colina abaixo, balançando as
tranças cheias de flores secas.
O velho pistoleiro sorriu e
lentamente fixou os olhos na rocha enorme que despontava alguns metros à
sua frente. Uma grande nuvem abafou o sol e da rocha sulcada, um homem
com uma túnica bordô surgiu flutuando e em seu trajeto pequenas flores
murchavam e caíam.
— .357, carregada, criança. — Disse pra si em sussurro enquanto punha-se de pé.
Abriu e fechou o tambor do revólver, apertando os olhos enrugados para
não perder a aparição da rocha ante o retorno da luz solar. Mais nuvens
mudaram as sombras daquela colina e pelas costas do pistoleiro, uma voz
funesta anunciou-se.
— Até o fim desta tarde, a chuva nos cobrirá.
O tiro furou o tecido gasto do casaco do pistoleiro. Dedos grossos
apertaram o metal da arma com firmeza. O homem da túnica bordô olhava
para o próprio peito, vazado pela bala e tingido por sangue, tom sobre
tom.
— Que juntem-se agora ambas as linhas de tempo e ganhe o melhor.
O homem na armadura infligiu a lâmina no mago no exato momento em que o
ar tingiu-se de azul e tudo girou, espiralando com grande pressão o
corpo embalado no metal. O tilintar da espada no cano do revólver
reverberou ao longe e ambos os homens jogaram-se para trás.
O
cavaleiro abaixou a viseira e correu enfurecido contra o homem reles de
trapos e com uma estranha peça de ferro polido. O pistoleiro deu dois
tiros contra aquela massa pesada que corria em sua direção.
Em
alarme, atirou a terceira vez, pondo-se para o lado. Não tinha certeza
de que sua bala surtiria efeito. Mas logo as gotas de sangue borrifavam à
altura do cotovelo e uma grande mancha adensava-se no peito do pé
esquerdo.
Embora tal acerto não tenha impedido o avanço
irrefreável. A espada aproximou-se o suficiente para abrir uma nova boca
no queixo do pistoleiro. Alguns dentes voaram enquanto o homem rolava
parte da colina.
Um pezinho balançou a bota do pistoleiro,
despertando-o em alarme. A mão tremulava enquanto tentava rapidamente
recarregar o tambor.
— Saía daqui, menina! — Balbuciou com grande agonia as palavras ensanguentadas.
Empurrou a menina e esta rolou até perto do fim da descida. Agradeceu a
sua própria sorte que aquela fera com uma espada descia tropegamente.
Teve tempo de mirar o topo da cabeça.
O cavaleiro anteviu aquela
ameaça estranha, tal qual uma abelha enjaulada, que feria mortalmente,
atravessando a potente armadura. Soube que não havia tempo para
sobreviver e rogou aos deuses que lhe permitissem partilhar da morte com
o inimigo.
Apertou a metade da lâmina direcionando-a como lança e arremessou em direção aquele homem de chapéu estúpido.
O pistoleiro descarregou os seis tiros e finalmente o cavaleiro
desabou, escorregando o peso de sua carne no próprio sangue, parando ao
seu lado. Sua espada cravada na terra, longe do alvo. O pistoleiro
empurrou o corpanzil sem vida e este jorrou sangue para o alto.
A menina terminava mais uma vez a subida e ficou ao lado da cena caótica, a rir.
— Vá pra desgraça de sua casa, pirralha.
Enquanto a menina mudava grotescamente sua aparência para a forma do
mago de olhos rasgados, a linha de tempo ajustava-se uma vez mais.
— Lhe encontrei em sua chuva de sangue, grande vencedor. Em breve teremos mais uma batalha. Revólver X Bala de Canhão.
Os bolsos do pistoleiro encheram-se de moedas de ouro. E o mago desapareceu.
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