Domingo - 14:00 - Morro da Bombinha Verde - Churrasco do Bolão.
"No samba ela me disse que rala..."
— Parô, parô! Abaixa o som aê, Guevara.
— Qual a bótica, Zidener? Parô pusq?
Bolão ergueu o triplo queixo enquanto virava o espeto de alcatra. Viu o pequeno alvoroço no meio da laje. A fumaça subindo forte.
— A tia Hebe tá tribuchando no chão.
A tia Hebe tremendo e da boca a farofa metralhada pro alto. Os caracóis alourados dançando no chão.
— Chama lá o doutor médico, Pituzinho. Corre, caceta!
— Afasta, irmão. Afasta.
Pastor Aparecido foi pisando e marcando território, de modo a abrir um circulo no contorno da tia Hebe.
— Ela tá engasgada com os osso do frango, pastor.
— Afasta, irmão.
— Aguenta, que Pituzinho foi chamar ajuda.
O pastor ergueu a mão rija pro alto e desceu-a violentamente. Era seu sinal de silêncio. E a mulher agitando no chão chapeado de cimento.
— Isso é demônio, irmãos.
— Deus é maior, pastor.
— Sangue de Jésu, tudo poderoso.
Dj Guevara ameaçou um rap das antigas mas cortou a função, tão logo Bolão lhe fez um sinal negativo.
— Então, pastor, vai ti partir pra zap e sete copa na tia?
— Vou, Bolão. Vou dar início ao ritual do exorcista poderosíssimo acaju.
Treze "Pai Nosso" e duas caipirinhas depois, o pastor juntou o material pro rito.
— Falta o vinagrete.
— Manda o vinagrete na mão do pastor, Pituzinho. Espera! Porra, Pitu! Tu não foi não buscar o médis?
— Saca, véi, nem tinindo ele tava na goma, aí tal e pá, fiquei sabendo dos rolê na praia com altas gata em teto de zinco quente.
— Saquei. Altas referências.
E todo mundo sacou e era muita sacanagem. Naquele momento no entanto, a medicina não salvaria uma pobre mulher possuída pelo escalão do inferno, como afirmou o pastor Aparecido.
— E não só é belzebu, como conde Dooku e salsi fufu. Isso é influência da televisão.
— Começa a bodega, pastor. Alcatra ressecada é de foder.
E Bolão tacou mais carvão.
— Em nome do todo poderoso sangue de Jesus, do trono de Yeshua, parta dessa tia Hebe, dragão da inflação, boleto atrasado do inferno.
Girou de pé-dois o pastor, suando e gritando. Parou, pegou o vinagrete.
— Olha que isso aqui tá muito bom, bééél zébius.
A possuída abriu meio olho negro Coala, farejou o ar e blasfemou pesadamente.
— Cebolete, hijo de puta madre.
O pastor agarrou a panela com farofa, salpicou-a no ar, abriu a pitu, assustando Pituzinho, bebeu, cuspiu a pinga, misturando-a na farofa, que caía com leveza, e neste milímetro de segundo triscou um fósforo Guarany que materializou-se no seu polegar, como prova da divindade presente naquela churrascada, e a chama explodiu.
— Bota o som de Deus, irmão Guevara, que a tia Hebe foi lavada pelo sangue do amor.
— Aleluia, pastô.
"Sessenta e sete patine..."
E todos comemoraram chinelando a estrutura, com a tia Hebe deitada, verde limão da cara, recuperando-se do engasgo, toda sardenta da queimadura farofenta à qual sofrera.
— Saiu fraldão suculento, gente familia, gente boa.
E Bolão, um brincalhão, um momo por natureza, brincou com o pastor enquanto girava uma corrente de linguiça apimentada.
— Essa é do capetão. É tipo o inferno são os outros, pastor. HÁ há há.
O pastor, escolado na escola da bobice que era, sacou o trezoitão.
— By the power of Rá.
Fim de domingo.
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